Re: [OLPC Brasil] Projeto Samurai explica porque não aplicar o OLPC

Jaime Balbino jaimebalb at gmail.com
Thu Dec 28 08:03:04 EST 2006


Zé Antônio,

Vou ter que discordar da posição do Carlos Rocha. Os pontos levantados
são importantíssimos, mas é a mesma argumentação da primeira
entrevista que deu ao portal G1. O que pode indicar duas coisas: ele
se aprofundou no estudo do projeto da OLPC e isto só o fez reforçar
sua posição, ou ele ainda não fez este trabalho, reciclando o próprio
discurso.

1. "...objetivos claros, planejamento a longo prazo, indicadores de
desempenho..." parecem óbvios em qualquer gestão pública. Não no
Brasil, infelizmente. Nos faltam gestores, pesquisadores que consigam
ir além das limitações dos projetos pilotos,fundos regulares para
pesquisa, etc... Poucos projetos nacionais conseguiram se organizar
suficientemente, ambos tinham características mais técnicas e
econômicas que sociais: o Pro-Álcool em seu início, com o rigor
militar ditatorial, e a automação das eleições, que contou com a
participação fundamental do própro sr. Carlos Rocha.

Apesar de lidarem com pessoas, comportamentos, milhares de pequenos
processos e centenas de variáveis sociais, estas foram iniciativas
sempre muito mais fáceis de mapear e organizar, utilizando-se modelos
científicos e estratégias de engenharia.

Os mesmos conceitos, por exemplo, não funcionam no INSS. Só com
alterações profundas neste modelo, com a inclusão de PNL e dezenas de
outras estratégias de apoio e acompanhamento, permitiu que o serviço
"Poupa Tempo", do estado de São Paulo, atingisse seus objetivos.

A falta de planejamento é um problema sério em educação. A falta de
vontade política de membros dos ministérios condenará o projeto da
OLPC de antemão, como um professor que já sabe quais alunos serão
reprovados e os marcam com o estigma do preconceito.

Este é um "nó" do planejamento que nunca fizemos e que não vejo como
pode ser resolvido diretamente, já que é tradição do nosso Estado.
Talvez seja  melhor cotinuarmos construindo outras ferramentas para
driblar a burocracia, o desprepraro e a má-vontade inerentes à
macro-estrutura.

2. Há, sim, uma pedagogia por traz do XO. Ela pode ser encontrada no
site, nos artigos e na tese do David Cavallo, no trabalho do
Negroponte, do Papert (com seus erros e acertos), as pesquisas de
campo do MIT e em tantos outros colaboradores. Há outras pesquisas
independentes (as do Reino Unido e da União Européia são as melhores),
também. A questão aqui talvez seja a maneira como normalmente
aplicamos a tecnologia na educação. Abordagens exageradamente
cientificistas ou técnicas tendem a produzir resultados mensuráveis
mas de pouca penetração na cultura escolar. Esta visão, muito baseada
num modelo genérico norte-americano, costuma submeter a pedagogia à
técnica sem um diálogo construtivo.

Este foi um fenômeno mundial que só recentemente começou a mudar, de
fato. O diálogo com mais qualidade começou a ocorrer com o
desenvolvimento da Modelagem Educacional e a evolução do foco no
planejamento do ensino, aplicando aí ferramentas mais avançadas de
administração, gestão, automação, ontologias, computação e, é claro,
pedagogia. Desde 1998 temos tido experiências inovadoras, frutos deste
novo diálogo. Infelizmente esta revolução, que começou na Europa e no
Canadá, ainda não chegou plenamente ao Brasil (e aos EUA). O trabalho
da OLPC tem muito desta nova abordagem e percebo que é mesmo difícil,
se não impossível, encontrar suas inovações baseando-se somente nos
antigos paradigmas.

3. R$ 26,4 bilhões de reiais em 4 anos... De fato este é outro "nó"
difícil de resolver. Mesmo assim este é o menor valor conseguido até
hoje por um projeto que objetiva não só a universalização, mas a
"individualização" do acesso à tecnologia. Esta conta sempre foi bem
maior e só serviam para fazer o sonho dos fabricantes de
hardware/software, pois este sempre foi um público impossível de
alcançar. Com lucro.

A queda gradativa e natural dos preços durante os anos poderia
diminuir este investimento em mais de 1/3. Estamos apenas no começo da
criação de um novo mercado, com necessidades específicas, tecnologias
devem ser criadas e barateadas, políticas públicas devem ser
desenvolvidas, modelos de negócio devem ser inventados. Mas não é só
isso...

Sejamos realistas... mesmo que este dinheiro existisse dificilmente
seria entregue a uma único fornecedor, não acha? Comercialmente, nem a
Quanta e nem a OLPC esperam ter o monopólio mundial do mercado de
laptops para crianças. A OLPC apenas "descobriu" um novo nicho,
deu-lhe um formato e venceu algumas limitações inerentes. Tudo o que
vier depois depende mais de nossa capacidade de continuar inovando do
que dela. Temos que pensar na "próxima inovação" e não só reproduzir o
que ela já fez.

Talvez o projeto do computador de R$ 1 pudesse ser implementado em
muito menos tempo (1 ano, talvez), garantindo a imediata
universalização. Por que não usá-lo também, então, se os recursos
necessários são tão menores? O importante é haver sinergia:
metodologias, softwares e objetivos devem ser intercambiáveis.
Confesso que não vi de imediato no computador de R$ 1 a garantia de
uma pedagogia progressista, como vi no XO e como vejo na revolução
silenciosa da União Européia. Talvez pelo baixo custo e por estar
"antenado" com a realidade das práticas dos nossos professores e
secretarias de educação esta seja uma característica do projeto. Mas o
diálogo construtivo pode e deve ocorrer.

Estamos no começo. Não vejo como um erro estratégico realizar
investimentos neste segmento, principalmente se ele se mostrar
compatível com nossas diversas realidades. Não se trata de um atalho
para uma ascensão primeiro-mundista, é um projeto que respeita as
diferenças e utiliza elas como motor de colaboração e superação. Nâo
duvido que o projeto do sr. Carlos e de tantos outros pesquisadores
brasileiros também o seja, só estou afirmando que este também o é.

Um abraço.

Jaime Balbino Gonçalves da Silva
http://www.dicas-l.com.br/educacao_tecnologia
Learning Desigener e Consultor em sistemas de ensino
Gestão, automação e adaptação em EAD
Pedagogo e Técnico em Eletrônica
Campinas, SP - Brasil
jaimebalb at gmail.com


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